O WhatsApp vai para o banco dos réus — OAB SP
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Não há dúvida de que o WhatsApp virou ferramenta de extrema importância para a comunicação no dia a dia das pessoas, quer seja no trabalho, quer seja para criar a interface em família ou em grupo de amigos, e até no uso de audiências e decisões do Judiciário. Mas o mesmo instrumento que permite todo esse aparato lícito garante aos criminosos o sigilo essencial para arquitetar planos infalíveis contra a sociedade. São integrantes do crime organizado operando inclusive atrás das grades, e de complexos penitenciários de segurança máxima. Por conta disso, quem está no banco dos réus é o aplicativo. Antes de levar a julgamento, para exigir – ou não – que haja uma porta aberta em que a Justiça possa entrar e tenha acesso às comunicações, o Supremo Tribunal Federal (STF) abriu o diálogo para ouvir todas as partes, em audiência pública realizada nos dias 2 e 5 de junho, com apresentação de pareceres técnicos e jurídicos.
O desfecho dessa história ainda está por vir, quando ocorrerem audiências da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) nº 403 e da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) nº 5.527. A Suprema Corte pode determinar ao Facebook, empresa responsável pelo programa, o fornecimento das informações quando pedido pela Justiça. Tribunais de instâncias inferiores já sentenciaram pela suspensão do serviço de troca de mensagens em quatro ocasiões por não ter atendido aos pedidos de envio de conversas “ilegais”. Em uma delas ficou 24 horas fora do ar. Todos os casos abrangeram investigações policiais. As ações no STF têm por base a violação ao preceito fundamental da liberdade de comunicação e expressão, garantido no artigo 5º, inciso IX, da Constituição Federal e o Marco Civil da Internet.
No campo de batalha, ao contrário do que argumentam os representantes do WhatsApp, Brian Acton – fundador do aplicativo – e Rick Reed, engenheiro de software da empresa, de que não existe a possibilidade de deixar uma porta aberta para fornecer instrumentos às investigações policiais, a Comissão de Direito Digital e Compliance da Seção São Paulo da Ordem dos Advogados do Brasil vislumbra a alternativa. Tanto é que prepara um estudo para pedir informações técnicas aos responsáveis pelo aplicativo comprovando esse impedimento. “Vamos entrar com o pedido de inversão do ônus da prova em prol da sociedade. Já que o WhatsApp alega não ter condições de fornecer os dados requisitados, terá de comprovar isso”, diz Coriolano de Almeida Camargo, que preside o grupo de trabalho da entidade.
As dificuldades técnicas apresentadas por Acton são de que as mensagens já transmitidas não podem ser lidas. Ou seja, não há como interceptar conteúdo legível porque o aplicativo não tem acesso às chaves privadas dos usuários, o que acontece quando o sistema tem como base a criptografia de ponta a ponta. Esta não pode ser violada. Porém, Pablo de Camargo Cerdeira, coordenador do Centro de Tecnologia da FGV, explica que a quebra seria viável, caso o aplicativo copiasse as chaves dos usuários para um servidor centralizado. Em passo contrário, Acton adverte que as mudanças no software teriam de ser mundiais: “Não existe WhatsApp só no Brasil”. Além disso, contra-argumenta, haveria conflitos éticos e jurídicos, porque os usuários acreditam que a comunicação é 100% segura.
Para especialistas em Direito Digital, não existe código que seja totalmente fechado e que não possa ser aberto pela Justiça, quando se tratar de ordem judicial. “Para tanto, a legislação precisa acompanhar os avanços tecnológicos”, avalia Renato Muller da Silva Opice Blum, primeiro vice-presidente da Comissão da OAB SP, que participou da audiência no STF. Ele pondera que os usuários não podem ser prejudicados por falta de entendimento entre Judiciário e prestador de serviços: “Seriam quase 100 milhões de pessoas prejudicadas”. Nessa linha, os representantes da Comissão citam outras soluções para o caso de bloqueio do serviço. “Há mais aplicativos, como o Telegran”, afirma Coriolano, ressaltando que o WhatsApp ganhou público mundial por sua facilidade de manuseio e por transmitir a sensação de essencialidade para as pessoas que desconhecem os aplicativos com a mesma funcionalidade. Tornou-se tão habitual a ponto de ser usado por juízes em audiências, conciliação, e para atos de comunicação da Justiça com o cidadão.
Em decisão recente, o Conselho Nacional de Justiça validou portaria, possibilitando a utilização do aplicativo no Juizado Especial Cível e Criminal de Piracanjuba (GO), sinalizando que irá liberar os tribunais para adotar, de forma facultativa, a prática em seus juizados.
Por sua vez, o advogado Paulo Thiago Rodovalho acredita ser necessária uma compatibilização entre o funcionamento de aplicativos e o dever de cumprimento das ordens judiciais de quebra de sigilo de mensagens. “Ou se fragiliza a investigação feita pelo Estado ou se fragiliza, em alguma medida, a segurança digital”, acredita. Os especialistas apontam haver mais opções de interceptação a comunicação entre criminosos, como programas de invasão que poderiam ser instalados em celulares sob suspeita, mas demandariam altos investimentos em tecnologia. “A justiça ambiciona ter acesso em tempo real às mensagens de comunicação do WhatsApp”, diz Coriolano.
Para Brian Acton, o Brasil seria o único país a questionar a criptografia. No entanto, há discussão sobre o acesso às conversas de aplicativos em diversas partes do mundo. Em 22 de junho último, a Alemanha aprovou uma lei para permitir às autoridades vigiar o conteúdo de mensagens criptografas de WhatsApp e Skype. Outras nações seguem o entendimento de que é preciso ter permissão, quando necessário, para combater casos de alta periculosidade, como de terrorismo, tráfico de drogas, sequestros, organizações criminosas e para o combate à corrupção. “Impedir o acesso, pelo próprio Poder Judiciário, viola nossa Constituição e a própria soberania brasileira”, adiciona Coriolano. O governo brasileiro também detém a característica de ser o quinto país com mais requisições de dados sobre usuários, atrás somente de Estados Unidos, Índia, Reino Unido e Alemanha. No primeiro semestre de 2016, foram requisitados dados de quase 4.500 usuários do Facebook, do WhatsApp e do Instagram, todos pertencentes à mesma empresa.
A primeira decisão para bloquear o WhatsApp no Brasil foi em fevereiro de 2015. Na ocasião, a empresa se recusou a conceder informações para uma investigação policial em Teresina (PI). O aplicativo sequer chegou a sair do ar. Em dezembro do mesmo ano, por um pedido da 1ª Vara Criminal de São Bernardo do Campo, ficou fora do ar por mais de dez horas. Já em 2016 foram atendidos pedidos de bloqueio pelo Judiciário de Sergipe e do Rio de Janeiro. Para Acton, foram medidas excessivas, uma vez que o WhatsApp tem cooperado com autoridades do país para responder as principais dúvidas.
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Advogado em São José do Rio Preto