Um mal dos nossos dias, depressão põe em risco carreiras jurídicas
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A depressão sempre existiu, mas, atualmente, vem se tornando mais comum. Primeiro, porque é exposta e discutida, Segundo, em razão das peculiaridades da vida contemporânea, na qual a estabilidade cedeu espaço para a incerteza na vida familiar e profissional. Segundo dados da Organização Mundial da Saúde (OMS), “mais de 300 milhões de pessoas vivem com depressão, um aumento de mais de 18% entre 2005 e 2015″[1].
É possível afirmar, sem aprofundamento científico, que a depressão pode ter origem física, podendo ser tratada com remédios, ou ter motivação psicológica, hipótese essa que exige o apoio de terceiros e, em muitos casos, tratamento com psiquiatra ou psicólogo.
Fatores como hereditariedade, decepções amorosas, perda de entes queridos, clima, más notícias na mídia, pressão por produtividade, desencanto profissional, problemas econômicos e descrença na política, entre outros, podem levar a pessoa a um estado de desesperança, pessimismo, ansiedade, isolamento e, em casos extremos, ao suicídio.
Mas a depressão não é um problema apenas para quem a sofre e seus familiares. A economia do país, as empresas, a Previdência Social, todos sofrem as consequências desse mal dos nossos dias. Segundo estudos da London School of Economics, no Brasil os prejuízos causados pela doença chegam a US$ 63,3 bilhões, o que resulta em grave prejuízo à economia e ao INSS, onde figura como a terceira causa de afastamento do trabalho[2].
No mundo do Direito, ela também se faz presente, desde os bancos acadêmicos até o mundo profissional no seu mais elevado nível.
A começar pelos estudantes de Direito que, além da perda de referências mais estáveis (por exemplo, religião), veem suas perspectivas profissionais sem grande ânimo. Os concursos tornaram-se extremamente difíceis, e a concorrência na advocacia tornou-se maior. Registra reportagem que o Brasil tem 1 milhão de advogados. Os dados são do cadastro nacional de profissionais mantido pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil[3].
Não é diferente em outras profissões jurídicas. Professores de faculdades privadas de Direito queixam-se de má remuneração. Nas mais conceituadas, onde os salários são melhores, reclamam da pressão pela publicação de artigos, financiamento para pesquisas e outros dados que elevam a pontuação da instituição junto à Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes).
Magistrados, agentes do Ministério Público, membros da advocacia pública e Defensorias queixam-se de trabalho excessivo e, por vezes, mesmo recebendo vencimentos acima da média, paradoxalmente deixam-se levar ao desânimo e à depressão.
Em todos os casos em que esse mal apareça, revelando seus sintomas, o primeiro passo a ser dado é não ignorá-lo. Os que dele sofrem devem exteriorizar suas preocupações com pessoas da família, colegas ou amigos em quem depositem absoluta confiança. Abrir-se, sem vergonha de aparentar fraqueza, é o primeiro passo.
Os que rodeiam os deprimidos devem, antes de mais nada, ouvi-los. Transmitir interesse em ajudá-los, aconselhá-los, discutir formas de solucionar o problema. Nos casos menos graves, uma voz amiga pode ser a solução.
Mas, independentemente da importante ajuda de terceiros, inclusive de profissionais especializados nos casos mais agudos, o deprimido deve esforçar-se para solucionar seu problema. Ele, na verdade, é o principal interessado em voltar à normalidade. Vejamos.
Estudantes de Direito enfrentarão um mercado pleno de concorrentes. Mas, se estiverem preparados para os novos tempos, as chances de sucesso serão muito maiores. Preparar-se significa interesse, dedicação, estudos. É essencial achar a área de seu gosto e adequá-la às perspectivas do mercado de trabalho. Imagine-se que decida ser advogado.
Cláudia Gasparini, da revista Exame, fez uma excelente pesquisa sobre os salários dos advogados neste ano[4]. A matéria foi dividida em nove áreas, e, por elas, o leitor pode vislumbrar o que o espera caso opte por uma delas. Por exemplo, um jovem de espírito mais aguerrido poderá dedicar-se ao tributário contencioso, onde o salário inicial, em empresas grandes, vai de R$ 4 mil a R$ 7 mil. Mas, se a luta não for do seu gosto, poderá direcionar o foco para o tributário consultivo, onde o salário é ligeiramente maior.
Entretanto, pode ser que não consiga vaga em um bom escritório. A opção é começar em um mais modesto, mesmo que mal remunerado. Quem estagia ou dá os primeiros passos em um escritório deve pensar que o salário não é tudo. Na verdade, estará aprendendo relações humanas, captação de clientes, forma de fixar honorários, administração do escritório, enfim uma série de coisas paralelas importantes.
A depressão não poupa os profissionais bem-sucedidos. Há alguns anos, convidado para palestrar para juízes do Trabalho de determinada região, constatei um clima de grande desânimo. Fiquei surpreso, porque as pessoas ocupavam posição de destaque pessoal, recebiam vencimentos muito acima da média e tinham todo o apoio do TRT, inclusive para fazerem cursos no exterior. Disseram-me que muitos tinham depressão.
Em casos como esse, a frustração pode ser pelo excesso de serviço, pelo desgaste da atividade, que exige um grande número de audiências diárias, ou até mesmo pela repetição da matéria. Seja qual for a causa ou as causas, problema de tal tipo exige enfrentamento. A cúpula de um tribunal deve tratar o caso com naturalidade e disponibilizar profissionais especializados para auxiliar o deprimido.
A pressão por resultados pode atingir também profissionais do Direito. Já estamos vivendo a época da avaliação e controle. Ninguém mais está livre de ser avaliado e de sofrer as consequências de seus atos. E no futuro ela será ainda maior. No filme Queda Livre, 1º episódio da 3ª temporada da série Black Mirror, da Netflix, todos avaliam todos o tempo todo e, dependendo dos pontos, a pessoa tem acesso às coisas. É um exagero, mas, ainda que não exatamente, assim será o futuro.
Pois bem, na iniciativa privada, mais do que na pública, o controle pode chegar a extremos. Um diretor jurídico de uma empresa pode ser pressionado a apresentar resultados e ser levado à depressão por não conseguir cumprir metas. O primeiro passo é tratar-se com terapia ou remédios. E, complementando, reservar uma hora do dia para si, um tempo sagrado para fazer o que gosta. Leitura, esporte, o que for do seu gosto, enfim.
Na segurança pública, o risco é maior. Além da remuneração ser inferior à dos cargos do MP e da magistratura, há o temor da morte quase que permanente, o receio de ser acusado por fazer ou não fazer (abuso de autoridade ou prevaricação) e, ainda, a falta de apoio da sociedade. Por isso, entre 2005 e 2014, transtornos psiquiátricos foram responsáveis por 14.756 afastamentos na Polícia Militar de São Paulo[5]. Óbvio que, diante de tal quadro, o único caminho é a prevenção, através de adequado serviço psicológico.
Por vezes a fuga da depressão exige coragem. Apesar do cargo seguro e bem remunerado, a pessoa não se sente feliz. Com “salário de 21.000 reais, estabilidade, prestígio. Geronimo Theml, de 43 anos, abriu mão de tudo isso para realizar um sonho que parecia delírio: abandonar uma sólida carreira na Advocacia-Geral da União (AGU) para se tornar palestrante motivacional”[6]. Evidentemente, uma mudança como essa deve ser bem avaliada.
Registre-se que os insucessos profissionais não devem ser motivo para desistir ou para a depressão. Ellen Northfleet foi a primeira mulher a chegar ao Supremo Tribunal Federal. Pouco tempo antes, havia sido indicada em lista tríplice para o Superior Tribunal de Justiça. No entanto, a escolhida foi Eliana Calmon. Ellen, então desembargadora federal no TRF-4, continuou suas atividades e pouco tempo depois foi indicada para o STF. O fracasso anterior foi recompensado com o maior cargo do Judiciário brasileiro.
Assim é a vida. A depressão, um mal dos nossos dias, deve ser combatida com as armas que hoje a Medicina e a Psicologia oferecem. E, mais do que tudo, com sentimentos de amor e amizade dos que convivem com o deprimido.
Vladimir Passos de Freitas é desembargador federal aposentado do TRF da 4ª Região, onde foi corregedor e presidente. Mestre e doutor em Direito pela UFPR, pós-doutor pela Faculdade de Saúde Pública da USP, é professor de Direito Ambiental no mestrado e doutorado da PUC-PR. Presidente da International Association for Courts Administration (IACA), com sede em Arlington (EUA). É vice-presidente do Ibrajus.
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Advogado em São José do Rio Preto