Raphael Nunes: Justiça não reconhece mediação escolar como emprego
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A obrigatoriedade de mediação escolar, por meio de profissional habilitado para tanto, em casos de inclusão de crianças com necessidades especiais nas classes comuns de ensino regular, seja em escolas públicas ou particulares, tem gerado, recentemente, controvérsia quanto à possibilidade ou não de se caracterizar vínculo empregatício desses profissionais com os pais da criança em terapia.
Tomemos como exemplo um caso concreto, cuja sentença foi proferida recentemente, e mantida em sede de Recurso Ordinário julgado pelo Tribunal Regional do Trabalho da 1ª Região: os pais têm uma criança diagnosticada com Transtorno de Espectro Autista e, em razão da necessidade de acompanhamento contínuo, a diretora da escola, na qual a menor encontra-se matriculada, exigiu de seus pais, como condição para manutenção de sua matrícula, que a mesma fosse assistida por profissional gabaritado, indicando clínica especializada para fins de terapia, assim como a presença de um mediador para acompanhamento diário nas atividades escolares.
A exigência da diretora da escola da menor pauta-se no parágrafo único do art. 3.º da Lei 12.764/12 (Lei Berenice Piana) que diz “em casos de comprovada necessidade, a pessoa com transtorno do espectro autista incluída nas classes comuns de ensino regular, nos termos do inciso IV do art. 2o, terá direito a acompanhante especializado.”
O colégio então indicou uma clínica especializada no tratamento terapêutico necessário, e
com o início do tratamento da menor no referido centro, a indicação de mediador foi feita por parte da psicóloga responsável pelo tratamento, considerando as respostas apresentadas pela menor dentro da referida clínica.
Cumpre destacar que de acordo com a CBO – Classificação Brasileira de Ocupações – instituída por Portaria Ministerial nº 397, de 9 de outubro de 2002, não existe este termo para denominar a função exercida pelos mediadores. De todo modo, a identificação dos mesmos junto aos registros administrativos são de ordem administrativa e não se estendem às relações de trabalho.
O Decreto 8.368/14, que veio regulamentar a Lei 12.764/12, dispondo em seu parágrafo 2º do art. 3.º que “caso seja comprovada a necessidade de apoio às atividades de comunicação, interação social, locomoção, alimentação e cuidados pessoais, a instituição de ensino em que a pessoa com transtorno do espectro autista ou com outra deficiência estiver matriculada disponibilizará acompanhante especializado no contexto escolar, nos termos do parágrafo único do art. 3.º da Lei 12.764/12”.
É importante destacar o fato de que a contratação do mediador deveria ser feita sob a responsabilidade e custeio da escola. Entretanto, considerando a proibição da cobrança de taxa adicional para alunos com deficiência física ou intelectual em escolas particulares, a instituição de ensino se posicionou no sentido de que não seria possível cobrir tal despesa com o repasse nas mensalidades aos pais dos demais alunos que integravam a classe, fazendo com que o custeio do serviço fosse imposto aos pais da criança com necessidade especial apenas, atitude que vai de encontro, inclusive, ao que foi regulamentado por nosso Ministério de Educação, em sua Nota Técnica 24/2013, conforme restará demonstrado a seguir.
Importante destacar que, sob o ponto de vista legal, o contrato de mediação escolar não gera vínculo de emprego, tomando como base o disposto no Decreto 8.368/14, que veio regulamentar a Lei 12.764/12.
O Ministério da Educação emitiu a Nota Técnica 24/2013 que dispõe que “as instituições de ensino privadas, submetidas às normas gerais da educação nacional, deverão efetivar a matrícula do estudante com transtorno do espectro autista no ensino regular e garantir o atendimento às necessidades educacionais específicas. O custo desse atendimento integrará a planilha de custos da instituição de ensino, não cabendo o repasse de despesas decorrentes da educação especial à família do estudante ou inserção de cláusula contratual que exima a instituição, em qualquer nível de ensino, dessa obrigação.”
No caso vertente, a escola considerou necessária a presença de um mediador para que a matrícula da menor fosse efetivada, ou seja, condicionou a matrícula da menor a esse procedimento, não deixando alternativa aos pais, considerando a necessidade de apoio nas atividades de comunicação e interação social no âmbito escolar.
Após a rescisão contratual, foram os pais da criança surpreendidos por uma Reclamação Trabalhista, por parte da profissional mediadora, que trazia em seu bojo diversos pedidos referentes a verbas trabalhistas que supostamente lhe seriam devidas, bem como pedido de reconhecimento de vínculo empregatício doméstico com os pais da criança.
Os Juízos de primeira e segunda instância ressaltaram, tanto em sentença, quanto em acórdão recursal, que a Lei Complementar nº 150/2015, a qual dispõe sobre o contrato de trabalho doméstico, em seu artigo 1º, define o empregado doméstico como sendo “aquele que presta serviços de forma contínua, subordinada, onerosa e pessoal e de finalidade não lucrativa à pessoa ou à família, no âmbito residencial destas.”
Destacaram ainda que, para que uma relação jurídica de trabalho seja reconhecida como de emprego é necessária a coexistência dos elementos essenciais contidos no artigo 2º e 3º da CLT , a saber: não eventualidade, onerosidade, pessoalidade, subordinação jurídica e alteridade, o que em nenhum momento restou comprovado nos autos, haja vista ter havido entre as partes litigantes, ou seja, os pais da criança e a mediadora selecionada, apenas contrato de prestação de serviços, conforme o disposto nos arts. 593 a 609 do Código Civil.
Ressaltaram os Julgadores ainda que a Lei nº 12.764/12, instituidora da política nacional de proteção dos direitos da pessoa com transtorno de espectro autista, em seu artigo 3º, parágrafo único, prevê a possibilidade de acompanhamento especializado nas classes comuns de ensino regular, em caso de comprovada necessidade, sendo esse exatamente o caso dos autos, em que a psicóloga da menor indicou o seu tratamento intensivo e por prazo indeterminado, sendo ela, inclusive, quem combinou a contraprestação financeira da profissional mediadora selecionada.
Verificamos, conforme o acima exposto, que o entendimento judicial atualmente vigente em nossos tribunais, até segunda ordem, é o de não caracterização de vínculo empregatício doméstico entre profissional prestadora do serviço de mediação escolar com os pais da criança em terapia, haja vista a ausência dos requisitos legais para tanto, quais sejam, o disposto na Lei Complementar nº 150/2015, que dispõe sobre o contrato de trabalho doméstico e os elementos essenciais contidos no artigo 2º e 3º da CLT , a saber: não eventualidade, onerosidade, pessoalidade, subordinação jurídica e alteridade. O entendimento atual é o de que pode haver, entre os pais da criança com necessidades terapêuticas especiais e a profissional mediadora selecionada, contrato de prestação de serviços, conforme o disposto nos arts. 593 a 609 do Código Civil, sendo que o referido contrato deve se dar nos moldes do disposto no Decreto 8.368/14, no parágrafo 2º do art. 3º a Lei 12.764/12 e na Nota Técnica 24/2013, expedida pelo Ministério da Educação
Raphael Nunes Sequeira é advogado da área trabalhista do escritório Neves Bezerra Advogados Associados.
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Advogado em São José do Rio Preto