EUA julgarão se defesa pode admitir culpa de réu que se diz inocente
[ad_1]
A Suprema Corte dos EUA vai julgar um caso em que terá de responder à pergunta: o advogado de defesa pode alegar, em um julgamento, que seu cliente é culpado, ignorando suas instruções para defender sua inocência, ou isso é uma violação ao direito constitucional do réu?
A pergunta decorre do que ocorreu em um julgamento em Louisiana, em que o advogado de defesa disse aos jurados, em suas alegações iniciais, que a Promotoria iria provar, além de uma dúvida razoável, que o réu, Robert McCoy, cometeu um triplo homicídio em 2008, quando matou o filho, a mãe e o padrasto da ex-mulher.
“Não há maneira razoavelmente possível de você chegar a qualquer outra conclusão, além de que Robert McCoy foi responsável pelas mortes dessas pessoas, depois de ver as provas que serão apresentadas contra ele”, disse o advogado Larry English aos jurados, sob os protestos do réu, que proclamava sua inocência.
A Suprema Corte também vai decidir, entre outras questões, quem manda em um caso, o advogado ou o cliente? E se o direito do acusado de ter um advogado, garantido pela Constituição, tem significado se, mesmo no melhor das intenções, o advogado ignora a vontade do cliente?
O advogado teria agido com boas intenções. Como ele acreditava que não havia nada que pudesse fazer para provar a inocência do réu, ele pensou que o melhor curso de ação seria salvar a vida dele. O advogado imaginou que, se admitisse a culpa de seu cliente, conseguiria uma condenação que não fosse a de pena de morte.
A estratégia não deu certo. McCoy foi condenado por homicídio de primeiro grau e sentenciado à pena de morte. Porém sua estratégia foi considerada válida nos tribunais estaduais, onde o recurso de McCoy tramitou. O Tribunal Superior de Louisiana decidiu que o advogado tentou uma “estratégia de julgamento razoável, à luz das provas contra McCoy”, e manteve a condenação.
Mas a estratégia não foi tão boa assim. English, que não era tarimbado na área criminal à época, seguiu uma linha de defesa baseada na capacidade mental limitada do réu. Porém, esse é um argumento que não encontra sustentação nas leis de Louisiana, o único estado do país que não adota a common law (a não ser por algumas influências).
Direitos do réu
A Promotoria tinha, de fato, um caso convincente contra McCoy. Sabia-se que ele andava procurando a ex-mulher pela cidade. Mas ela estava sob proteção da polícia, depois que McCoy ameaçou matá-la e cometer suicídio. A gravação de um telefonema para a polícia mostra que a mãe da ex-mulher gritou para McCoy que ela não estava em casa, que estava com os detetives, quando se ouve um tiro e a chamada cai.
O carro dele foi visto transitando na área e, depois, abandonado. No carro, a polícia encontrou o celular de McCoy. Finalmente, ele foi preso em Idaho, para onde foi de carona com caminhoneiros. Preso, ele tentou se matar.
McCoy insiste, porém, que foi vítima de uma armação de traficantes de drogas com policiais para imputar o crime a ele. No julgamento, ele protestou várias vezes contra a atuação de seu advogado. Mas o juiz Jeff Cox disse que não iria atrasar mais o julgamento e que não permitiria ao réu trocar de advogado, nem fazer a própria defesa.
Agora, McCoy é representado por advogados do Centro de Assistência Capital de Louisiana, que defendem na Suprema Corte um novo julgamento para ele. Para esses advogados, o julgamento de McCoy não cumpriu a promessa da Sexta Emenda da Constituição de garantir ao réu a “assistência de um advogado em sua defesa”.
“É inconcebível que os autores da Constituição pretenderam que a assistência de um advogado devesse vir a um preço tal em que o advogado de defesa seja autorizado a dizer ao júri que o réu é culpado, mesmo sob os protestos do réu que defende sua inocência”, escreveu o advogado Richard Bourke, que serve a instituição.
A Faculdade de Direito da Universidade de Yale, a número um do país, também saiu em defesa de McCoy. O professor Lawrence Fox escreveu uma petição de amicus curiae, na qual afirma: “A decisão sobre se a culpa deve ser admitida é, em última análise, do réu. Esse é um ponto que está no coração do direito do réu a uma defesa — um direito que pertence pessoalmente ao réu”.
Orientações básicas
De uma maneira geral, os advogados americanos entendem que há uma diferença fundamental entre culpa factual (o que o réu realmente fez) e a culpa jurídica (aquela que um promotor pode provar). Segundo o site Nolo, um bom advogado não se pergunta se seu cliente cometeu ou não o crime. Ele se pergunta se a Promotoria pode provar que sim. Não importa o que o cliente fez, ele não é culpado até que o promotor ofereça provas suficientes para convencer um juiz ou um júri a condená-lo.
No entanto, um advogado de defesa não pode mentir para o juiz ou para o júri, alegando especificamente que o réu não cometeu um delito que ele sabe que cometeu. Em vez disso, as táticas e os argumentos do advogado devem se focar na falha da Promotoria em provar todos os elementos do crime.
A Promotoria sempre tem algumas dificuldades naturais para provar acusações. Por exemplo, o cliente rouba a bolsa de uma senhora na rua, mas a vítima não consegue identificá-lo. Rouba uma loja, mas a gravação da câmera de segurança não é clara ou o guarda de segurança da loja já estava muito cansado ou há havia consumido bebida alcoólica.
Os advogados de defesa são obrigados, eticamente, a representar bem todos os clientes, seja os que serão provavelmente considerados culpados ou os que serão provavelmente considerados inocentes. Uma defesa vigorosa é necessária para proteger o cliente e para assegurar que os juízes e os cidadãos que compõem o júri (e não a polícia) tenham o poder supremo para decidir quem é culpado ou não de um crime.
Na verdade, o advogado de defesa muitas vezes não sabe, realmente, se o réu é culpado ou não do crime pelo qual é acusado. Mesmo se o cliente diz a ele que é culpado, isso pode não ser verdade. O cliente pode estar assumindo a culpa para proteger alguém. Ou pode assumir que é culpado de um crime mais grave, quando, na verdade, é culpado de um delito mais leve.
Por essas razões, entre outras, um advogado de defesa não pergunta, normalmente, se seu cliente cometeu ou não o crime de que é acusado. Em vez disso, ele usa os fatos e a lei para fazer a melhor defesa possível e deixa a questão sobre a culpa ao juiz ou ao júri.
João Ozorio de Melo é correspondente da revista Consultor Jurídico nos Estados Unidos.
[ad_2]
Advogado em São José do Rio Preto