Ricardo Barretto: Liberação das drogas faz Estado deixar de ser refém
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Será que ninguém vê o óbvio? Será que os governos, a sociedade não são capazes de perceber que a guerra policial contra o tráfico de drogas é uma guerra cara, é uma guerra perdida, que já dura décadas, sem nenhum resultado positivo, e que está levando a nossa sociedade à condição de refém permanente do crime organizado, sitiada pela violência?
Quando se insiste obstinadamente numa estratégia, seja na guerra, seja em outros fatos da vida e essa estratégia não apresenta o mínimo resultado positivo, por que não pensar em mudar a forma de combate? Foi assim com a inflação, em que se tentou quase uma dezena de planos econômicos, todos focados no congelamento de preços e todos fracassados, até que se buscou outro rumo, justamente o da liberdade de preços, como um dos seus pilares, derrotando-se o que atormentava a nossa economia por décadas seguidas, a espiral inflacionária.
Temos exemplos históricos de que reprimir nunca foi a solução, a liberdade é sempre o melhor caminho. O mais clássico deles aconteceu nos EUA, com a lei seca. Proibiu-se o consumo de bebidas alcoólicas, sem se atentar que o ser humano, em sua essência, gosta de consumir bebidas alcoólicas e entorpecentes. Sempre gostou e jamais ira deixar de faze-lo. Com a lei seca, a sociedade americana era refém da máfia. Extinta a lei seca, o crime organizado nos Estados Unidos sofreu o seu mais duro revés e a sociedade viu-se pacificada, muito mais domesticada em termos de consumo de bebida, por conta da advertência publicitária de que o seu consumo exagerado faz mal à saúde.
Aqui no Brasil, há alguns anos, fumar cigarro nos conduzia à ideia equivocada de glamour. As propagandas mostravam pessoas belíssimas, mulheres e homens, montando cavalos, esquiando, pilotando automóveis caros, passando a mensagem de que quem fumava cigarro comum estaria fadado ao sucesso profissional. Tivesse o cigarro sido proibido, teríamos, seguramente, os “barões” do crime organizado garantindo o seu comércio e em luta constante com a Polícia, como se vê hoje com as drogas consideradas ilícitas. Nosso País, no particular, adotou uma política inteligente. Não proibiu o uso do cigarro, mas proibiu a propaganda positiva e impôs uma propaganda negativa incutindo, na sociedade brasileira, principalmente nos mais jovens, a ideia de que “fumar é cafona”. Resultado. Os fumantes, hoje, têm vergonha de fumar, escondem-se para fazê-lo e respeitam as restrições de não fumarem em determinados locais. O Brasil teve o seu consumo de cigarro extremamente reduzido, sendo um dos países onde menos se fuma no mundo, tudo por conta da publicidade contrária.
Se liberarmos o comércio e o uso dessas drogas, impondo-se as mesmas restrições que são impostas ao consumo de cigarro, e adotarmos uma publicidade massiva contra o seu uso, o consumo diminuirá abruptamente, quebrando-se as pernas do crime organizado, afastando-se o principal fato gerador da corrupção policial que o crime acarreta, com a consequente diminuição da violência urbana. É uma equação simples.
Basta que se tribute o consumo, proíba-se que o produto da arrecadação entre na conta geral da União e seja utilizado apenas para a construção de hospitais destinados à recuperação de drogados e à publicidade contra o uso dessas mesmas drogas. Essa ressalva da receita tributária do comércio de drogas não integrar a conta geral da União e não sofrer os efeitos da DRU – Desvinculação de Receitas da União – objetiva justamente que o Estado não se torne dependente desses recursos, para que eles não sejam utilizados para outros fins. Seriam arrecadados pelo Ministério da Fazenda e utilizados apenas pelo Ministério da Saúde na recuperação dos drogados e na publicidade contrária ao uso das drogas.
Diminuindo-se o consumo, os hospitais construídos para recuperar viciados poderiam ser utilizados para outros fins de saúde pública, com benefício social evidente, com muito menos gasto financeiro e de perda de vidas que se tem hoje na forma clássica do combate ao comércio de drogas.
A continuar nessa mesma estratégia falida, no futuro, acontecerá aqui o que aconteceu na Colômbia. Tal como os colombianos, necessitaremos negociar a paz com os narcotraficantes, como se eles fossem um estado independente.
Ninguém é ingênuo para imaginar que, mesmo com essas medidas, o tráfico de drogas vá deixar de existir. Existirá, mas andará de moletas, como andam os contrabandistas de cigarro e bebida, sem a dimensão dos danos que o comércio de drogas ilícitas impinge hoje à nossa sociedade. Na verdade, os consumidores irrecuperáveis de droga são minoria, como o são os alcoólatras inveterados. O que não é razoável é tornar a sociedade refém do crime, por conta de poucos que jamais deixarão de cultivar os seus vícios. A esses, será concedido tratamento de saúde adequado.
Por cautela, poderíamos começar com a liberação da maconha e outras drogas consideradas mais leves. Iriamos testando. Afinal, não há estatística dizendo que o consumo de maconha aumentou no Uruguai e em alguns estados americanos. O que aumentou foi a arrecadação tributária, mas esse não é o objetivo nosso. O objetivo é diminuir o consumo das drogas e, acima de tudo, vivermos numa sociedade mais pacificada, mais segura, menos violenta.
Ricardo César Mandarino Barretto é juiz federal aposentado. Integrou o Conselho Nacional do Ministério Público. É mestre em Direito Econômico pela Faculdade de Direito da Universidade Federal da Bahia
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Advogado em São José do Rio Preto