Réu em processo por corrupção deveria ser submetido a júri popular? — OAB SP
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SIM
A impressionante República Federativa do Brasil tem tudo para dar certo, ou pelo menos o necessário para oferecer a seu povo melhor qualidade de vida. Além da insuportável concentração de renda para qualquer república capitalista, índices espetaculares de corrupção são diretamente responsáveis pelo estado de miserabilidade de tantas famílias. Os dados oficiais (IPEA, IBGE) variam, mas há muito expressam que mais de 60% dos brasileiros dependem do Estado para sobreviver. Assim, direitos fundamentais, portanto indisponíveis, como saúde, moradia, educação e segurança, encontram-se comprometidos pela corrupção passiva e ativa, pois além da malversação de verbas públicas por gestores e representantes políticos, assiste-se a verdadeiros atos de bandidismos pelos empresários.
Implementar disposições constitucionais voltadas para melhor participação política é a solução. Os cidadãos são os melhores vigilantes do patrimônio público. Atente-se para a instituição da Rede Paulista de Ouvidorias, coordenando, em São Paulo, 393 ouvidorias dos órgãos públicos, acolhendo cidadãos e suas demandas, e encaminhando-as às autoridades e à Ouvidoria Geral do Estado, e também à Corregedoria-Geral de Administração.
Com urgência devemos desenvolver a cultura da transparência, embora a cultura jurídica brasileira, bem como algumas ferramentas reveladas na cultura da paz (conciliação, mediação, arbitragem), ainda não assimilaram que estão aptas a atuar ad instar no Conselho de Sentença para julgar crimes de corrupção na administração pública ou em esfera privada em suas variadas formas. Com efeito, a questão há de ser respondida pelo sim, pois se faz razoável, oportuna e célere. Vejamos:
A corrupção no governo brasileiro – em todas as esferas –, imbricada ou engastada com a iniciativa privada, coloca em xeque a própria noção de Estado Democrático de Direito (a exemplo da Operação Lava Jato).
Basta registrar como recurso pedagógico a anedota – e ridendo castigast moris – contada pelo ministro Marco Aurélio, do Supremo Tribunal Federal: “… de que um sujeito ingressou em uma livraria para comprar uma Constituição Federal, recebendo do vendedor a resposta de que ali não se vendiam periódicos”, por ocasião da ADI 3.104-DF.
A instituição de júri popular para julgar crimes de corrupção deve ser implementada – sim – e, para tanto, deve-se desvincular a ideia de que a instituição do Conselho de Sentença só serve para julgar os crimes dolosos contra a vida.
Não importam as denominações, ambos os institutos jurídicos – júri popular para crimes contra a vida e júri popular para corrupção – podem funcionar concomitantemente. Basta o Estado-Administração fornecer os meios para a implantação, com as garantias constitucionais fundamentais do devido processo legal.
O júri popular competente para julgar crimes de corrupção deve ser implementado na administração pública, no âmbito do Direito Administrativo, cujas decisões e julgamento terão força de lei/executiva (quando não cumpridas).
Apesar de a Constituição Federal, em seu artigo 5º, XXXV, dispor que: “A lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”, entendemos que a gênese do júri popular (corrupção) é de natureza administrativa e sua estruturação a teor do que vem disposto no inciso LV: “Aos litigantes em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e a ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes”. Destarte, caberia ao Judiciário apenas a execução do julgado do Conselho de Sentença, caso a decisão não fosse cumprida.
Tais providências, além das devidas alterações constitucionais, requerem também mais respeito ao direito fundamental à informação, bem como propiciar aos cidadãos brasileiros educação cívica para integrar o júri popular como participação direta do povo nas funções do poder público. Aperfeiçoando, assim, nosso Estado Democrático de Direito.
Eunice Aparecida de Jesus Prudente – Advogada e professora da Faculdade de Direito da USP e da USF
NÃO
Segundo nossa Constituição, o júri popular tem competência para o julgamento dos crimes dolosos contra a vida, sendo soberana sua decisão. A previsão constitucional veio inscrita no capítulo dos direitos e garantias individuais e é tida como cláusula pétrea, razão pela qual se tem entendido que não se pode esvaziá-la, por meio da exclusão de crimes, mas sua ampliação é possível, inclusive sem que se faça qualquer alteração constitucional.
Todavia, apesar de não haver impedimento constitucional para a inclusão do crime de corrupção no âmbito da competência do tribunal do júri, é preciso refletir sobre a conveniência político-criminal de tal opção, bem como sobre sua efetividade.
A decisão de deixar nas mãos de juízes leigos o julgamento de crimes dolosos contra a vida decorre de uma opção política, fundada em alguns fatores. Dentre eles, a concepção de que tais crimes formam um núcleo central de injusto, que atinge o bem jurídico individual mais relevante do ser humano – sem a vida, não se pode dispor dos demais bens. Assim, o exame de tais delitos não deveria se limitar a concepções puramente jurídicas, devendo-se permitir análise mais livre da conduta (embora, evidentemente, com limitações ligadas à prova). Ademais, haveria uma decisão social menos mediada sobre a conveniência de se condenar ou absolver dada pessoa em razão de um suposto fato tão ligado à convivência e paz sociais.
Neste ponto, deve-se lembrar que os jurados decidem de acordo com a própria consciência e com os ditames da justiça, sem necessária vinculação à lei, à doutrina ou à jurisprudência sobre dada matéria. O fato de o júri não precisar fundamentar suas decisões reforça esse dado: o jurado não decide técnico-juridicamente. Isto não quer dizer que sua decisão seja melhor ou pior do que aquela tomada pelo juiz togado, mas apenas que o caminho para se chegar à decisão é distinto.
Cumpre então indagar se essa forma de proceder é conveniente para o julgamento de crimes de corrupção. Tais crimes exigem a compreensão de questões tecnicamente mais complexas – tais como o conceito de funcionário público para fins penais, o de ato de ofício etc. – não sendo tão simples sua intepretação por parte de leigos. Seria um verdadeiro contrassenso se as discussões no plenário do júri estivessem centradas mais no exame de tais conceitos do que, propriamente, nos fatos e provas colhidas. Sob esse ponto de vista, não parece ser político-criminalmente recomendável que os jurados passem a julgar os crimes de corrupção.
Também sob o ponto de vista da efetividade não se trata de medida recomendável. O procedimento do júri engloba três fases distintas, razão pela qual, logicamente, é mais longo e moroso do que os demais procedimentos no processo penal. Após a investigação sobre os fatos, em regra feita por meio de inquérito policial, há o oferecimento de denúncia, que inaugura a primeira fase, denominada de juízo de acusação. Após seguir todos os atos processuais previstos, que incluem oitivas de testemunhas, interrogatório, peças escritas, dentre outras, será proferida decisão de pronúncia, de impronúncia, de desclassificação ou de absolvição sumária. Na hipótese de pronúncia, inaugura-se a segunda fase, o juízo da causa (ou juízo de preparação do plenário), na qual serão feitos requerimentos de diligências e a preparação do processo para o julgamento perante o júri. Estas duas fases ocorrem perante o juiz singular. Finalmente, haverá o julgamento em plenário, para o qual devem ser respeitadas determinadas formalidades. Há nova produção de prova e ocorrem os debates. É fácil perceber que este procedimento não traria agilidade ao julgamento de crimes de corrupção e, provavelmente, resultaria em menor efetividade da aplicação da lei.
Não há, pois, motivos que recomendem que o júri passe a julgar os crimes de corrupção. Será mais salutar, certamente, manter a competência do juiz togado para tais crimes e deixar que o povo participe da luta contra a corrupção nos demais âmbitos, sobretudo por meio do exercício do direito a voto de modo mais consciente e atento.
Helena Lobo da Costa – Advogada e professora de Direito Penal da USP
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Advogado em São José do Rio Preto