Campelo Filho: É preciso (re)pensar o ensino jurídico no Brasil
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Neste mês de agosto, no dia 11, é celebrado o Dia do Advogado. Muito já tenho escrito sobre a importância do advogado para o Brasil e para a manutenção do Estado Democrático de Direito, uma vez ter a missão do advogado a prerrogativa de ser essencial à própria administração da Justiça. É claro que não pode haver democracia onde não se tenha na Justiça (em todas as suas vertentes) o seu principal ponto de apoio e de sustentação. Porém, na qualidade de membro da Comissão Nacional de Educação Jurídica do Conselho Federal da OAB, penso ser importante tratar do ensino jurídico no Brasil, ou seja, tratar dos futuros advogados, os mesmos que amanhã deverão abraçar essa importante missão que é servir à pátria.
Os primeiros cursos jurídicos instalados no Brasil datam de 1828, criados por força da Carta Lei de 11 de agosto de 1827, promulgada por D. Pedro I[1]. Nesse período, surgiram os principais juristas brasileiros da sua história, tais como Rui Barbosa (1849-1923), Tobias Barreto (1839-1889), Clóvis Beviláqua (1859-1944), Teixeira de Freitas (1816-1883) e Pontes de Miranda (1893-1979)[2]. A questão, contudo, é que, passados quase 200 anos, o país nunca presenciou uma crise no ensino como a que se tem descortinado neste século XXI. De fato, a educação jurídica brasileira[3] enfrenta uma grave crise de identidade. Digo identidade uma vez que o Brasil ainda adota o velho discurso da teoria versus prática[4] como corolário dos debates sobre o ensino jurídico[5].
A mencionada crise é refletida em alguns fatores, tais como os baixos índices de aprovação no Exame da Ordem (se se considerar o Exame de Ordem Unificado, do II ao XIII, a média de aprovação é de apenas 17,5%)[6], o desinteresse dos alunos pelas aulas (magistrais em sua quase totalidade), a quantidade de cursos de Direito que são reprovados em avaliações feitas pela Ordem dos Advogados do Brasil, através da Comissão Nacional de Educação Jurídica, e ainda pelas críticas constantes feitas por juristas, tanto no tangente à abordagem dogmático-jurídica tradicional quanto à mudança paradigmática da filosofia da consciência para a filosofia da linguagem[7], e ainda pelo enfoque que se tem dado nos cursos de graduação à preparação dos alunos para a realização de concursos públicos[8].
Os cursos jurídicos no Brasil possuem em sua quase[9] totalidade uma grade curricular arcaica (tradicional-ortodoxa), que apenas informa um conteúdo muito mais voltado ao exercício prático do que à formação, com metodologias de ensino arcaicas e desestimulantes (baseadas em aulas magistrais), que não se adequam ainda às inovações tecnológicas e à melhor forma de ensinar as chamadas gerações Y e Z.
É a ilusão de que há trabalho e emprego para todos, independentemente do mérito da qualificação. Ledo engano, uma falácia que só se concebe em um país que ainda não atingiu o nível de maturidade necessário para compreender a importância de uma formação de base, dogmática e principiológica, fundada em valores que têm o condão de penetrar no ser e efetivamente transformá-lo. E o mercado produtivo está repleto de desempregados (mal) graduados[10]. Mais uma triste realidade.
Nesse diapasão, não é difícil afirmar a necessidade de que o ensino jurídico brasileiro precisa ser (re)pensado. Na hipótese, porém, o (re)pensar não significa encontrar um forma de (re)adequá-lo, mas antes transformá-lo. (Re)Pensar o ensino jurídico é tratar do futuro do país, é preparar pessoas para a pós-modernidade, para enfrentar os novos desafios que exsurgirão de uma sociedade cada vez mais complexa e global.
Disciplinas relacionadas à Filosofia Jurídica e à História do Direito, em par com outras de formação, como a Sociologia Jurídica e a Hermenêutica Jurídica, deveriam estar presentes nas grades curriculares, obrigatoriamente, mas não como meras coadjuvantes, como representantes da parte mais desinteressante do curso, e sim como destaques, como essenciais, como disciplinas fundamentais que efetivamente são.
Edgar Morin, antropólogo, sociólogo e filósofo francês, que também é formado em Direito, critica o descaso do ensino para com as disciplinas propedêuticas ao tratar da hiperespecialização que impede tanto a percepção do global (que ela fragmenta em parcelas), quanto do essencial (que ela dissolve). Para ele, a referida hiperespecialização termina por impedir até mesmo de se tratar corretamente os problemas particulares, que só podem ser propostos e pensados em seu contexto. A questão, para Morin, é que os problemas essenciais nunca são parcelados, e os problemas globais são cada vez mais essenciais. Assim, enquanto a cultura geral comportava a incitação à busca da contextualização de qualquer informação ou ideia, a cultura científica e técnica disciplinar parcela, desune e compartimenta os saberes, tornando cada vez mais difícil a sua contextualização[11].
Que neste mês em que se comemora o Dia do Advogado, pois, possamos não apenas exaltar (com muita justiça, por sinal) a profissão, mas, principalmente, discutir o futuro da advocacia, que passa necessariamente pela formação jurídica da graduação superior, para que amanhã os profissionais do Direito tenham plenas condições de exercer com ética, com respeito à sociedade e às instituições democráticas, calcados em um conhecimento sólido e profundo, essa nobre profissão.
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Advogado em São José do Rio Preto