Aumento da intolerância religiosa preocupa especialistas — OAB SP
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O Brasil – “país tropical, abençoado por Deus e bonito por natureza”, cantado por Jorge Ben Jor – recentemente deixou de lado suas qualidades e mostrou sua face cruel: a da intolerância. O Ministério dos Direitos Humanos divulgou números que mostram um crescimento nos casos de intolerância religiosa. De acordo com esses dados, o país registrou entre janeiro de 2015 e o primeiro semestre deste ano uma denúncia a cada 15 horas. O Disque 100, canal que reúne queixas, iniciado em 2011, registrou, neste ano, 169 casos, sendo 35 apenas em São Paulo, e aponta a maioria das vítimas sendo de religiões de origem africana, com 39% das denúncias.
A Constituição Federal de 1988 dispõe no seu artigo 5º, inciso VI, garantias à liberdade de crença: “é inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e a suas liturgias”. Já o Código Penal estabelece, em seu artigo 208, crime “escarnecer de alguém publicamente, por motivo de crença ou função religiosa; impedir ou perturbar cerimônia ou prática de culto religioso; vilipendiar publicamente ato ou objeto de culto religioso”, passível de pena de detenção, de um mês a um ano ou multa. Em caso de violência, a pena será aumentada em um terço.
A presidente da Comissão de Liberdade Religiosa da OAB SP, Damaris Dias Moura Kuo, lamentou os números apresentados e destacou que os números computados pela Comissão também não são animadores. De acordo com Damaris Kuo, nos últimos dez anos a OAB SP computou 200 processos sobre o tema, e de 2012 a 2017 tem registrado uma consulta, orientação ou esclarecimento por dia: “Historicamente, a intolerância religiosa está presente no país desde o Brasil colônia, mas hoje existe uma percepção maior do problema”, afirma.
Para Damaris, a violência às religiões africanas, que registram 3,1 milhões de adeptos no Brasil, apresenta um viés racial e uma falta de respeito em relação ao conceito de crença e à forma como as pessoas manifestam a sua religiosidade e, assim, rejeitam o que é diferente. A advogada não enxerga uma “guerra santa” no país por conta desses fatos: “Existem indivíduos que têm atacado as religiões de matrizes africanas, mas não podemos chamar de “guerra santa”. Rotular desta forma pode criar um ambiente perigoso e estimular o discurso de ódio religioso”.
De acordo com Milene Cristina Santos, membro da Comissão de Liberdade Religiosa e autora do livro “Intolerância religiosa: do proselitismo ao discurso de ódio”, a escalada de violência física por motivação religiosa aponta ao menos para a necessidade de proibição do discurso de ódio. “O que falta é uma compreensão das autoridades de que não haverá estado laico e liberdade religiosa, especialmente para os adeptos das religiões de matrizes africanas, se esses crimes não forem levados mais a sério”, especifica.
O vice-presidente da Comissão de Liberdade Religiosa da OAB SP, Jader Freire de Macedo Junior, não acredita que a polarização política vivida pelo país nos últimos anos tenha influenciado no aumento da intolerância religiosa no Brasil. “O recrudescimento tem ocorrido no mundo todo e não é privilégio brasileiro, embora a maneira praticada aqui seja diferente da intolerância praticada no restante do mundo”, aponta.
Acerca da legislação vigente, Damaris explica que o Brasil precisa de políticas públicas e de aperfeiçoamento legislativo: “A nossa legislação é garantidora do direito, mas não é regulamentadora”. Por sua vez, o advogado Jader Freire não destaca a fragilidade da legislação como o maior problema, mas sim o fato de ela não ser cumprida. “Nós não precisamos mudar a lei, apenas cumpri-la, mas quem tem a obrigação de cumprir não o faz, sempre atenua. Muitas vezes, o agente público que pertence à religião, que é a mesma do agente que cometeu o ilícito, atenua o ocorrido”, denuncia.
Milene Santos também relata que já existem leis suficientes sobre o tema, sendo necessário apenas a boa aplicabilidade. “Não concordo que não haja legislação específica para os crimes de intolerância religiosa. Existe o crime de ultraje a culto do art. 208 do CP, o crime de injúria qualificado por motivação religiosa do art. 140, parágrafo terceiro, e o crime que tipifica o discurso de ódio religioso no art. 20 da Lei 7716/89”, diz.
Ação na Corte
Em 20 de novembro último, os juristas Hédio Silva Junior, Jader Freire de Macedo Junior e Antonio Basílio Filho protocolaram petição para processar o Brasil na Corte Interamericana de Direitos Humanos por crimes contra as religiões de origem africana, medida que pode trazer um conforto para quem tenha seus direitos violados. “Se o Brasil for condenado, o Estado poderá ter de indenizar religiosos vítimas dessa intolerância”, explica. Macedo Júnior esclarece que a medida foi tomada porque as autoridades não registram os casos como intolerância. Elas autuam apenas como destruição de propriedade privada. “Levamos o Brasil à Corte Interamericana para que o Estado explique as razões dele não se preparar de forma correta para combater os crimes de intolerância religiosa.”
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Advogado em São José do Rio Preto