Assembleias legislativas não se preocupam com meio ambiente
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A Constituição Federal de 1988 dedicou especial atenção à proteção do meio ambiente, assim dispondo no artigo central sobre a matéria:
Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.
Vê-se, pois, da redação acima, que ao Poder Público impõe-se o dever de preservar o meio ambiente para as presentes e futuras gerações. Isto significa que toda a administração pública, direta ou indireta, na esfera federal, estadual e municipal, deve zelar pela preservação ambiental.
É certo que, na divisão de poderes tradicional, ao Poder Legislativo cabe legislar sempre que necessário sobre o tema ambiente, ao Executivo, executar suas atividades de forma que elas se compatibilizem, ao máximo, com a proteção do meio ambiente e, ao Judiciário, sempre que chamado a manifestar-se sobre o assunto, nos conflitos coletivos ou individuais que lhe sejam submetidos, decidir de forma a atender o comando constitucional.
Mas, além deste dever óbvio, outro há que passa, geralmente, despercebido: os órgãos públicos, no exercício de suas atividades, estão obrigados a agir da mesma forma. Em outras palavras, a administração pública, na sua rotina, tem o dever de valer-se de todos os meios para que o meio ambiente seja preservado.
Vejamos um exemplo às avessas, ou seja, o que não se deve fazer. Brasília é uma cidade com uma luminosidade intensa. Entretanto, os idealizadores de seus edifícios públicos ignoraram as condições climáticas e o resultado foi a existência de lindos prédios, que permanecem o dia inteiro com as luzes acesas, gastando energia elétrica inutilmente. Flagrante prejuízo para o meio ambiente.
Na rotina das repartições públicas, quase 30 anos depois, o artigo 225 da Constituição é ignorado. Honrosa exceção é o Poder Judiciário. No Tribunal Regional Federal da 4ª Região, em 2000, foi criado o gabinete da sustentabilidade, promovendo-se economia de água, eletricidade, papel, que passou a ser usado também no verso, e outras medidas.
O Conselho Nacional de Justiça, pela Resolução 201, de 2015,[i] dispôs sobre “a criação e competências das unidades ou núcleos socioambientais nos órgãos e conselhos do Poder Judiciário e implantação do respectivo Plano de Logística Sustentável” em todos os tribunais brasileiros, exceto o Supremo Tribunal Federal, que a ele não está subordinado. Atualmente, todas as cortes vêm dando espaço a tais iniciativas e um bom exemplo disto é o Tribunal Superior Eleitoral, que editou a Resolução 23.474, de 19/4/2016, implantando um Plano de Logística Sustentável em todos os Tribunais Regionais Eleitorais.[ii]
Mas se o Poder Judiciário vem na liderança, o Poder Executivo segue os seus passos. O mesmo não se pode dizer das assembleias legislativas dos estados. Vejamos.
As assembleias legislativas são espaços com enorme circulação de pessoas, não apenas seus deputados e servidores, como também todos os interessados no acompanhamento de projetos de leis estaduais. Muito embora isto seja fato notório, não é fácil materializar a afirmativa em dados concretos, porque quase todos os sites não esclarecem quantas pessoas trabalham no órgão.
Exceção à regra é a Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul, que registra, explicitamente, em maio de 2017, a existência de 1.430 funcionários em atividade, mais 54 estagiários, 669 inativos, que vez por outra a ela devem se dirigir[iii], os trabalhadores da limpeza e vigilância (terceirizados) e o público em geral, é possível imaginar a quantidade de pessoas que transitam pelo órgão diariamente e que se utilizam de papel, copos de água, copinhos para café, ar refrigerado, elevadores e tudo o mais.
Se assim é para o Rio Grande do Sul, imagine-se o movimento diário e as necessidades de assembleias de estados mais populosos, como São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais.
Uma visita aos sites das 27 assembleias legislativas do Brasil surpreende e decepciona, pela total ausência de preocupação com a gestão ambiental. Na realidade, os órgãos do Poder Legislativo Estadual estão parados no tempo, sem nenhuma preocupação maior com o meio ambiente.
É absolutamente necessário que se criem unidades socioambientais em todas as Assembleias Legislativa, promovendo-se, entre outras providências, eliminação de copos de papel, economia de energia elétrica, exame do material descartado, que deve ser separado e reciclado, compra de produtos de limpeza biodegradáveis, torneiras que fecham automaticamente, lâmpadas LED, exame da origem dos insumos de madeira a partir de fontes de manejo sustentável e outras medidas. Tudo isto com a imprescindível educação ambiental dos servidores, sem o que não haverá sucesso.
Nas assembleias legislativas, revelam os sites que algumas possuem uma Comissão de Deputados, que se dedica às questões ambientais do Legislativo. Segundo o site da AL de São Paulo, “As Comissões Permanentes são órgãos técnicos compostos por grupos de sete, nove ou onze parlamentares indicados para compô-las, por períodos de dois anos e têm a incumbência de discutir e apreciar projetos de lei, emendas e outras proposições, antes de sua votação em Plenário; convidar ou convocar autoridades públicas para prestar esclarecimentos e realizar audiências públicas”.[iv]
Por exemplo, a AL do Rio Grande do Norte tem Comissão de Defesa do Consumidor, Meio Ambiente e Interior.[v] A AL do Mato Grosso criou um Certificado de Responsabilidade Social que identifica nas empresas “… a forma de interação das empresas e de demais entidades com a comunidade e sua relação com o meio ambiente”.[vi]
Tais Comissões são importantes, mas nada têm a ver com a gestão ambiental. Na verdade, seus objetivos são outros. Gestão ambiental mesmo, é assunto ignorado pelas Assembleias Legislativas, descumprindo flagrantemente a Constituição Federal e, certamente, a dos respectivos estados.
O que se poderá fazer em relação a esta omissão?
A primeira e mais fácil medida seria cada AL criar uma Comissão de Gestão Ambiental, mirando-se no exemplo dado pelo Poder Judiciário e também no da Câmara Federal e do Senado, que possuem programas denominados, respectivamente, EcoCâmara e o Núcleo de Coordenação de Ações Socioambientais do Senado Federal.[vii]
A segunda seria a procuradoria-geral da Justiça dos estados oferecer recomendação aos presidentes das assembleias legislativas, para que tomem iniciativa a respeito, sob pena de propositura de ação judicial.
A terceira seria o exercício da cidadania, através de ação civil pública a ser proposta em juízo contra a assembleia legislativa, por omissão no seu dever constitucional de zelar pela preservação do meio ambiente.
O importante é que haja conscientização do problema e que ele não seja relegado ao comodismo da omissão, tão ao gosto dos que preferem criticar a tomar qualquer tipo de iniciativa. Portanto, voluntária ou obrigatoriamente, devem as assembleias legislativas atentar para a mudança dos tempos e adaptar-se às novas exigências sociais.
Vladimir Passos de Freitas é desembargador federal aposentado do TRF da 4ª Região, onde foi corregedor e presidente. Mestre e doutor em Direito pela UFPR, pós-doutor pela Faculdade de Saúde Pública da USP, é professor de Direito Ambiental no mestrado e doutorado da PUC-PR. Presidente da International Association for Courts Administration (IACA), com sede em Arlington (EUA). É vice-presidente do Ibrajus.
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Advogado em São José do Rio Preto